Informação em defesa da democracia
segunda-feira, 11 novembro , 2024

É sempre um homem

Os fatos últimos, tanto de violência política quanto sexual, expõem uma sociedade viciada na figura masculina.
Bolsonaro faz sinal da Arminha com as mãos.

Os recentes casos de violência tanto física quanto sexual que tomaram lugar no cotidiano brasileiro chocaram a opinião pública pela aparente normalidade com a qual foram perpetradas por seus algozes.

No sábado (9), um policial penal, Jorge Guaranho, — atente-se, agente da lei, ao menos à priori — sentiu-se em pleno direito de invadir uma festa familiar e atirar em seu aniversariante, o guarda municipal Marcelo Arruda, militante do Partido dos Trabalhadores (PT).  

Evidentemente, Guaranho é o típico homem que demonstra sua força através de uma arma.

Jorge Guaranho é policial penal, cuja atuação se dá, principalmente em presídios.
Jorge Guaranho é policial penal, cuja atuação se dá principalmente em presídios. Foto: Reprodução.

É válido salientar que nenhum tema deveria ser passível de tal violência: o mais ferrenho antipetista, ou mesmo antibolsonarista, deveria se ater às regras da democracia, e ao seu conceito mais primordial: o do diálogo e da discordância pacífica.

Contudo, é assustador o fato de que as violência políticas, principalmente em época de eleições, tiveram aumento significativo. Só entre 2020 e 2022 foram 23% mais casos de violência política, conforme aponta o Observatório da Violência Política e Eleitoral, do Giel (Grupo de Investigação Eleitoral) da Unirio (Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro).

É fato, claro, que as discordâncias podem estar e se fazer nos mais diferentes aspectos que a democracia e o estado democrático de direito têm: há quem acredite que uma voz de um líder supremo, forte e autoritário é o que o Brasil precisa nesse momento. Há quem acredite em uma revolução armada como solução. Paciência, a democracia tem disso.

Contudo, é inegável que o assassinato promovido por Guaranho tem caráter político e evidencia toda uma ideologia social torpe centrada num tipo específico de sexo biológico, moral, costumes e lado espectro político.

Embora eufemismos sejam usados para se dizer que as investigações estão em curso, há, sim, um clima de ódio por quaisquer ideias que rondem o espectro político mais à esquerda. Ideias que falem sobre consensos, como a própria violência, já são logo taxadas pela pecha de “esquerdistas”.

É um ódio que tem origem clara no discurso oficial de Bolsonaro.

Que, por sua vez, se apresenta como “machão”, mas tem sua virilidade questionável — haja vista sua incapacidade à execução de flexões, exercício que, inclusive, deveria ter feito mais vezes durante seu período na Academia Militar dos Agulhas Negras.

Sejamos francos: todos sabíamos que Bolsonaro seria esse tipo de mandatário.

Bolsonaro sempre teve em suas falas, gestos e palavras de cunho machista, homofóbico e misógeno. Foto: Paulo Whitaker/Reuters
Bolsonaro sempre teve em suas falas, gestos e palavras de cunho machista, homofóbico e misógeno. Foto: Paulo Whitaker/Reuters

Coube, porém, à consciência de cada um o voto e o fato de levar para o travesseiro a responsabilidade de entregar o país a um tipo como é o Presidente: machista, homofóbico, misógino e violento.

E aqui chegamos a outro ponto importante da fala: o caso do estupro posto a cabo pelo médico anestesista Giovanni Quintella Bezerra, o qual só expõe mais uma faceta de uma lógica que privilegia homens, brancos e de maior grau de instrução formal.

O médico anestesista Giovanni Quintella Bezerra foi acusado de estupro de vulnerável depois de violentar mulher que estava em trabalho de parto. Foto: Reprodução.
O médico anestesista Giovanni Quintella Bezerra foi acusado de estupro de vulnerável depois de violentar mulher que estava em trabalho de parto. Foto: Reprodução.

O que se percebe, ao fim e ao cabo, é que nossa sociedade como um todo é viciada em homens: foco de todo bem, mas também autores de todo mal.

Há de se comentar que o ato do médico, gravado pelas enfermeiras, é um dos muitos que ocorrem no país: eles estão nas piadas sexistas, nos toques inoportunos e inaceitáveis, no uso da força para um beijo, na interrupção de falas e atos feitos por mulheres, entre muitas outras coisas — e que também são ditas ou feitas pelo próprio presidente no chiqueirinho em volta do Palácio da Alvorada.

O que une esses casos é o fato de que todos têm a presença de um homem, os quais se sentem no direito de fazerem o que bem querem: um aponta a arma para qualquer um que discorde dele; outro fala asneiras em frente à residência oficial e outro abusa como se isso fosse algo normal.

Não houve, em nenhuma dessas personagens, qualquer receio de punição: pelo contrário, seus atos demonstram uma certeza assustadora da segurança que sua condição de homem os confere no Brasil.

Tanto Guaranho, quanto Bolsonaro e Quintella Bezerra exalam sua essência masculina: um se sente forte ao portar uma arma; outro sente se sente machão ao fazer chacota com jornalista sobre um furo; e o último se satisfez através de um ato absurdo e desumano.

Saliente-se: eles não são monstros. São homens. É sempre um homem.

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